"Como você consegue se adaptar,
depois de tantos meses no mar?".
Em seu novo relato sobre barcos
e viagens, Amyr Klink confessa
não conseguir deixar de se
espantar com essa pergunta
"típica de desmiolados que
imaginam haver no mar tempo
sobrando para fazer filosofia".
E basta singrar as páginas de
suas novas memórias afetivas -
um afeto por homens e barcos
(nessa ordem, sem a menor
dúvida) - para partilhar do
espanto de um autor cada vez
mais direto e incisivo ao
discursar sobre suas paixões. A
história em torno da qual giram
as várias outras histórias deste
livro é a da construção,
lançamento e navegação do
Paratii 2, "um barco simples
como canoa e cargueiro como
navio". E a busca dessa
simplicidade e dessa amplidão
demanda um tempo que no mar é
sempre escasso, um tempo que
aflige enquanto não produz
resultado, mas que permite
armazenar na memória tudo que
contribuiu para que o barco de
Amyr fosse o mundo - repleto de
tipos antológicos, apetrechos
insuspeitados, como um "enganchador
de moças" e "bichos peçonhentos"
perfuradores de dedos
aventureiros, e momentos de
tensão em que dez segundos podem
decidir o destino do navegador.
O leitor acompanha o nascimento
do interesse de Amyr pelos
barcos, sua paixão pelas canoas
de Paraty, as leituras
desfrutadas no sótão e as
histórias recolhidas pelo mar.
Testemunha também as pesquisas,
os testes e as viagens
empreendidas para realizar o
sonho de um barco capaz de
passar anos inteiros nas terras
geladas da Antártica e levar na
tripulação crianças e suas
fantasias infantis. O novo livro
de Amyr Klink traz um barco como
tema, mas o homem é o porto. E,
como toda boa história marítima,
tem até tesouro enterrado.
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